Olá, pessoal. Conforme havia prometido, vou continuar a lhes contar sobre a minha experiência aqui nos Jogos Panamericanos de Toronto. São quase 2 horas da manhã do dia 26 de julho e não consigo dormir de tanta coisa boa que aconteceu no dia de meu aniversário, ontem. Por estar distante da família e para não sentir muitas saudades, procurei preencher meu dia com dois shifts (escalas), trabalhando o dia todo nas finais do Handebol, e não podia ter sido melhor.
Logo cedo recebi de meus novos amigos canadenses uma caixa cheia de bolinhos, com uma velinha acesa. Cantaram parabéns em inglês, francês, espanhol e até em italiano (muito engraçado) e para terminar, os meninos da nossa seleção de Handebol conseguiram a Medalha de Ouro em uma disputada e emocionante final. De arrepiar e eu estava lá, trabalhando, sofrendo, curtindo e me divertindo.
Os bastidores de um evento deste porte nem sempre são um mar de rosas e, desta vez, tendo um olhar mais crítico, confesso que algumas coisas me preocupavam muito até o início do Pan. Mas nestes tempos modernos, com a utilização das redes sociais, tudo fica mais tranquilo.
Assim que fomos selecionados, foi criado um grupo de Facebook onde os voluntários poderiam obter maiores informações do evento e começar a se conhecer. Outros “filhotes” deste grupo surgiram para cada Venue (arena de trabalho) e, como éramos um grupo de brasileiros que já trabalhamos em outros eventos no Brasil, tínhamos o nosso próprio grupo, além do “zapzap” que foi de grande utilidade para que nos ajudássemos até a chegada à cidade dos Jogos.
Muita informação rolou e, bem próximo ao evento, com todo mundo já embarcando, surgiu uma grande questão:Muitos estavam com os nomes escritos no sistema do Pan de forma diferente do que está nos passaportes, que seriam os documentos válidos para os estrangeiros retirarem as credenciais e sem os quais o “security check” não libera a credencial. Houve quem tivesse que esperar praticamente uma semana para fazê-lo e tive o mesmo problema com a companhia aérea, pois em quase todos os formulários, temos os campos Name, Middle Name and Surname e, se você preenche diferente do que consta do passaporte, possivelmente terá problemas. Como já estava atenta a tudo isso, liguei para o call center da organização e fiz a minha alteração do Brasil com tempo suficiente para realizarem as mudanças. Fica a dica.
Tudo resolvido, chegamos a Toronto e começamos a nos comunicar Aqui tem “Internet free” praticamente em todo lugar e apsar de nem sempre serem redes seguras, dá para usar tranquilamente para funções básicas de um celular.
No primeiro dia conheci Dani Castro, brasileira, baiana, que mora em Toronto, voluntária da credencial. Foi ela quem nos ajudou na verificação dos nomes e nas primeiras dicas de como nos locomovermos pela cidade que, por sinal, é muito fácil. Há duas linhas de metrô interligadas, muitos charmosos streetcars (estilo bondinhos elétricos), ônibus e trens. Com a credencial em mãos, tivemos acesso livre a todos durante o Pan: era só mostrar que estava liberada a viagem. Não precisava de cartão, ninguém ficava olhando nada, na maior confiança. E ainda os motoristas nos agradeciam, cultura canadense de respeito ao voluntariado.
Quando recebemos os uniformes em sessão agendada previamente, ganhamos um kit com duas camisetas, boné, mochila, agasalho impermeável, e alguns brindes de patrocinadores. Não recebemos calça nem tênis e o comitê exigia que usássemos calça preta ou escura sem ser jeans, sem grife aparente, bem como tênis preto ou cinza. Já nos treinamentos percebemos que seria impossível controlar isso pois, os próprios canadenses estavam usando shorts e sapatos, sandálias, tudo diferente. Mas, ainda assim, como boa respeitadora das regras, acabei vestindo o uniforme adequadamente, até o momento em que sucumbi à necessidade de caminhar de casa até minha Venue para me exercitar , porque trabalhava muito tempo sentada, e passei a usar meu melhor tênis, o mais colorido possível. Como ninguém falou nada, passou a ser meu sapato oficial.
Dentre os brindes do uniforme estava uma entrada para o ensaio oficial da Cerimônia de Abertura dos Jogos. Combinamos de nos encontrar e nos conhecer pessoalmente em frente ao Aquário de Toronto, onde fica o Rogers Center (palco da abertura e casa do time de Baseball Blue Jays) e a CN Tower, e assim fizemos. Já nos entrosamos e assistimos ao show em grupo.
No dia seguinte, assistimos à Cerimônia Oficial de Abertura na Nathan Phillips Square, onde havia um dos locais de PANAMANIA, a Fun Fest daqui. Dois palcos de show, muitos telões, um local fechado para consumo de bebidas alcoólicas, várias tendas de parceiros do evento fazendo as mais diversas atividades e distribuindo brindes para o público. Obviamente, não poderia faltar, uma Mega Store com os produtos exclusivos do Pan, muito caros para nossos bolsos. Praticamente em todos os lugares de competição havia uma loja destas e pelo menos quatro praças de Panamania. Downtown ficou agitadíssima.
Iniciada minha participação após quatro dias de passeios turísticos pela cidade, fui totalmente relaxada para o treinamento presencial porque ali é que conheceria realmente minha função. Para minha surpresa, havia gente no nosso grupo que nunca havia visto handebol na vida, inclusive um dos coordenadores. Entrei em choque: como vamos fazer estatística sem que a pessoa tenha noção do jogo? Pois é, aconteceu. E como a “Alma Voluntária” fala sempre mais alto, “arregaçamos as mangas, tomamos as rédeas” de tudo e acabamos dando conta do recado.
Acredito que uma das partes mais importantes do evento seja o treinamento presencial e, infelizmente, foi um ponto bem “down” aqui. Tivemos que lidar com um sistema complexo, com pessoas inaptas e isso fez que o resultado não fosse o desejado para um evento internacional deste porte. Além do mais, as estatísticas de jogo são coisas sérias pois delas surgem pesquisas, feedbacks aos técnicos e atletas sobre seu desempenho, etc, e isso jamais poderia acontecer em um Panamericano.
O tratamento dado aos voluntários foi o básico dos básicos: “Ok, você se candidatou, está aqui, pode ir trabalhar, muito obrigada, esperamos que tenha gostado”. Havia um centro de descanso onde tudo acontecia: fazíamos check in na sala ao lado e nos encontrávamos com os líderes para distribuição de tarefas no Break Room.
Neste mesmo local, tomávamos as refeições (péssimas no início, mas que foram melhorando um pouco depois). Havia uma bancada com café, leite e chá à vontade, e só. Para quem trabalhou na Copa, tínhamos jogos como tênis de mesa, air table, pufs para tirar uma soneca, computadores com acesso livre, etc, o que promovia maior intercâmbio e convivência alegre entre os voluntários, líderes e até chefes de departamentos. Aqui, este lado foi zero.
Por outro lado, na Arena de Handebol, conheci muitas pessoas e por falar português, inglês e espanhol, consegui me comunicar com quase todos do meu setor. Fiz muitas escalas dobradas — éramos poucos e muitos moradores locais tinham seus compromissos — então, em muitos dias passei o tempo todo no Exihibition Centre. Nos intervalos entre os períodos de jogos (dois por período), ia para a Panamania, tomava um pouco de sol, tomava sorvete gratuito oferecido pelo banco patrocinador e tentava ver as apresentações daquele momento. Tudo muito lindo, louco e altamente diversificado em um banho de cultura.
O Exihibition Centre é um pavilhão que acolheu o Volleyball , o Handball, Squash e depois Racquetball. Enorme, limpo e com ar condicionado a mil (muitos dias passei frio dentro enquanto o sol queimava todo mundo lá fora), com os banheiros sempre impecavelmente limpos e cheirosos, por incrível que possa parecer.
A área também contava com muitos cestos de lixo seletivo, mas deixou um pouco a desejar na pouca quantidade de bebedouros, na sinalização confundindo os torcedores que não sabiam para onde ir e o controle de acesso. Havia somente uma entrada para todas as competições daquele pavilhão e, principalmente nos jogos de volleyball, quando o público era maior, formava-se uma fila muito grande. A organização dizia que era uma questão de segurança.
Eles devem ter seus motivos, porém ao chegarmos para o trabalho, passávamos por uma revista nas mochilas e pelo raio-x manual, o que é um procedimento normal em todo evento também, mas aqui era bem menos radical e só não entrava garrafa com líquido — provavelmente para evitar consumo de álcool –. Mas até pau de selfie e guarda-chuva, podia.
Ponto totalmente OUT foi a transmissão televisiva para cá e para o Brasil. Não havia cobertura de todos os esportes e aqui no Canadá só víamos competições onde os donos da casa estavam se sobressaindo. Péssimo.
Nos bastidores tudo era festa e podíamos tirar foto e filmar, o que geralmente é proibido aos voluntários. Até os policiais daqui pousam para fotos com os turistas.
Enfim, foi um evento realizado em toda sua totalidade, com prós e contras. Acho que a parte cultural do Canadense de respeito às individualidades fez com que houvesse maior flexibilidade com relação às regras de comportamento e nós, brasileiros, podemos confundir isso com um certo “desleixo”. O importante é que tudo deu certo e a população local, que não aceitava inicialmente o evento, acabou participando e ficaram com gostinho de “quero mais”.
Certamente vou aproveitar muito de tudo mais que vivi por aqui em minhas próximas experiências profissionais, e já chegarei a São Paulo munida de toda energia para continuar minhas aventuras, agora com as gestantes do Lar Meimei e com os Voluntários Selecionadores da Rio2016.
Amei a cidade, amei trabalhar aqui e continuo amando meus novos amigos voluntários que, sem dúvida, viveram momentos incríveis nestes Jogos Panamericanos 2015.